sexta-feira, 15 de abril de 2011

Carta aberta ao Presidente da República extensiva a todos líderes Africanos

Sua excelência Presidente da República de Moçambique

Antes de mais permita-me manifestar a minha insegurança e receio por esta ousadia (escrever para vossa excelência).

Sou um simples cidadão moçambicano, jovem (geração do segundo quinquénio da década de 80). Não me assimilo com nenhuma formação política no país, porque defendo princípios que podem não compactuar com comportamento político nalgumas vezes ou situações. É por essa razão que tenho a liberdade e alegria de conviver com todos os cidadãos moçambicanos sem limitações e sem colocar condicionalismos ou olhar para a cor da camisola que um indivíduo traz.

No entanto, isso não me limita nem me impede de participar e contribuir activamente na vida política do meu país e do mundo. É por essa razão que, tanto o Sr. presidente da República de Moçambique, tanto alguns cidadãos e actores políticos influentes da nossa sociedade, como o caso do cidadão Armando Guebuza, os partidos e/ou cidadãos que se dizem da oposição em Moçambique, escapam das minhas críticas, quando agem de forma que considero incorrecta, ou quando as suas atitudes e/ou acções prejudicam ou põem em causa os interesses e necessidades da nação Moçambicana. Para tal, tento fazê-lo sempre com cuidado e respeito, tentando ser o mais racional, lógico, objectivo e imparcial possível, mas olhando sempre para os interesses dos cidadãos e do país.

É nesta óptica que, reconheço o esforço do cidadão Armando Emílio Guebuza, como combatente da luta de libertação Nacional, como defensor da causa e interesses da nação e o esforço e empenho que têm dedicado ao país, como presidente da República, e aproveito desde já agradecer por tudo que já fez por Moçambique. O mesmo reconhecimento vai para todos aqueles que deram ou que continuam a dar o máximo de si para o bem-estar do país e dos moçambicanos.

Da mesma forma que não fecho os olhos para (fingir) não ver o que as pessoas fazem de bom, também não deixo de questionar e reflectir sobre alguns acontecimentos e realidades que me inquietam no meu dia-a-dia como cidadão deste país. Falo concretamente do "fenómeno" de obtenção ilícita de riqueza por um grupo de cidadãos moçambicanos, incluindo figuras políticas, algumas das quais ocupam cargos de maior responsabilidade no governo de Moçambique. Considero enriquecimento ilícito pela falta de transparência em muitos processos de criação e gestão de empresas no país, assim como algumas participações em empresas. Espero que o meu argumento para justificar a ilicitude na obtenção de riqueza esteja claro, não necessariamente convincente.

Quero igualmente manifestar o meu desagrado e insatisfação por alguns "políticos de garagem", bem como alguns "jovens cegos e lambe-botas", que se dizem patriotas e defensores dos interesses do cidadão moçambicano, quando na verdade querem uma porta que lhes dê acesso à "sala magna e restrita" de oportunidades, para tirarem benefícios pessoais. Quero também desde já chamar atenção da Sua excelência para este tipo de jovens, eles são muito perigosos. Estou em crer que o Estado Moçambicano não investiu muito dinheiro para a formação destes jovens (porque a maioria foram beneficiários de bolsas de estudo do governo moçambicano), só para serem "yes boss", porque se esse fosse o objectivo, não haveria necessidade de os formar. Eu acredito, Sr. Presidente, que o Estado formou esses indivíduos para poderem contribuir na construção dum Moçambique próspero, mais livre (de qualquer ameaça) e harmonioso, através de críticas abertas ao que não estiver correcto, sem olhar para quem seja dirigida a crítica. Quanto aos "políticos de garagem", quero igualmente chamar a sua atenção, Sr. presidente, porque, a par dos jovens "lambe-botas", estes são também perigosos, poderão vender o país, abrir as portas para o inimigo, tal como está acontecer particularmente na Líbia.

Aliás, é exactamente sobre os movimentos de revolta na África do norte que me dirijo à Sua excelência, com especial atenção à Líbia, dado que tem características específicas.

Quando estes movimentos tiveram início na Argélia e tiveram maior repercussão e impacto na Tunísia, seguindo-se para o Egipto (prefiro escrever assim porque originalmente é Egypt, não vendo razão, por isso, para escrever Egito), estive do lado do povo que reivindicava a melhoria das suas condições de vida e fim de regimes "ditatoriais". Nessa altura, acompanhava também as reacções da dita comunidade internacional, comandada pelos Estados Unidos da América e Nações Unidas (não sei se há diferença entre Estados/Nações Unidas, mas deixemos isso para lá), esta que apelava a calma e a uma transição pacífica.

No entanto, logo depois da capitulação (prefiro assim chamar) de Mubarack, a onda subiu para a Líbia, mas parece-me que aqui não foi a mesma onda, aqui vi uma onda ocidentalizada. Na Líbia vi centenas, senão dezenas de civis nas ruas, nas mesmas proporções que no Iémen, Argélia e Bahrein. Para o meu espanto, um dia depois já estavam lá homens armados, que ao invés de levantar cartazes com variadas escritas, tinham armas em punho, ai questionei-me, será esta uma evolução da forma de manifestação, que substitui marchas pacíficas com cartazes, por armas? Até o momento ainda não encontrei resposta dentro de mim. Para a minha maior admiração ainda, as Nações/Estados Unidos, chamaram a estes indivíduos de rebeldes, até aqui tudo bem, porque o são, mas as mesmas Nações/Estados Unidos, com Obama como rosto de cartaz, subiram imediatamente ao pódio para impor (não apelar) que Kadafi deve abandonar o poder e, no dia seguinte as mesmas pessoas se reuniam para impor "duras" sanções contra a Líbia. Com a resistência do Coronel Kadafi, os mesmos reuniram-se dias depois para suspender a Líbia do Conselho de Direitos Humanos da dita ONU, para depois "inventarem" uma resolução que os autorizava a matar os líbios (pois é, porque para mim não importa de quem venha o tiro, este não escolhe o alvo). Claro que faz todo o sentido, depois de suspender a Líbia dos Direitos Humanos, implica que os líbios perderam automaticamente os direitos humanos, ou seja, já podem ser mortos "legalmente" (isn´t that Mr. Obama?).

Eis que no dia seguinte começaram a exibir o seu instinto animal, atirando mísseis e bombas que custam biliões de... (não sei qual é a moeda). Mas para usar 25% desse valor na compra de comida ou investir para criar emprego para as vítimas de pilhagem e guerras em África, a justificação é a mais clássica e irrefutável (crise global...), enfim... No entanto, na mesma altura, milhões de cidadãos japoneses precisavam de água, comida, abrigo e aqueles aviões usados para matar pessoas na Líbia, para resgatar outros milhares que continuavam (continuam) nos escombros. Onde estava a OMS? (Japan has no oil...hahahahaha).

Mas em todo este processo, o que me deixou angustiado e raivoso, foi o facto de alguns ditos representantes de países Africanos terem apoiado os imperialistas para matar pessoas na Líbia.

Meus caros combatentes das lutas de libertação em África, tenho sinceramente muito respeito e orgulho de terem deixado a vossa juventude para lutar pelas independências e defender a liberdade dos vossos povos, e mais uma vez agradeço porque foi graças a vossa coragem que nasci e cresço livre, talvez seja por essa razão que sou muito sensível quando há indícios da perturbação e ameaça das nossas liberdades e independências. Indivíduos que se dizem defensores de direitos humanos, de liberdades individuais e auto-determinação dos povos, hoje estão a voltar meus combatentes, para nos declarar incompetentes e dizer que não estamos em condições de guiar os nossos próprios destinos.

Neste contexto Excelência, quero, através desta carta, manifestar a minha inquietação com relação as novas formas de subordinação dos Africanos, e que a mesma seja partilhada com os demais dirigentes africanos, de modo a que seja reflectida na agenda e debates da União Africana e outros fóruns, com o objectivo de criar bases sólidas e potenciar a solidariedade entre os povos africanos, porque parece-me que num futuro recente, ou melhor, já estamos a precisar desta união, para combater um velho e conhecido inimigo, que volta com as mesmas tácticas “dividir para reinar”. Esta é, sem dúvidas, uma preocupação manifestada por um moçambicano anónimo, mas pode ser de muitos outros africanos que se preocupam com os últimos acontecimentos no continente.

Pode parecer coincidência, mas consideremos o seguinte facto: Muammar Kaddafi é um seguidor incansável dos ideais de Kwame Nkrumah, Samora Machel e demais líderes defensores da coesão entre os africanos, o que ao acontecer, colocaria em causa muitos interesses (ilícitos) económicos e políticos de potências ocidentais (que se intitulam comunidade internacional e por isso se vêem no direito de arbitrar injustamente a vida dos outros países). Portanto, Kaddafi constitui grande ameaça para eles.

Não estou a favor da morte de civis, seja na Líbia, seja num outro país, mas que fique bem claro que, independentemente das ditas convenções "impostas" aos países pobres, ninguém tem o direito de autorizar que se bombardeie outro país sob falsos pretextos. Já fizeram isso no Iraque, as Nações unidas autorizaram a matança de pessoas e consequente criação dum caos no país, e já o fizeram em tantos outros países. Um grande homem que tanto o admiro, talvez porque tenha morrido sem descarrilar, Martin Luther King Jr. dizia, e com toda razão "Os ocidentais são arrogantes e ignorantes, pensam que podem ensinar tudo ao mundo, mas nunca querem aprender dos outros”.

Já me desculpei pela minha ousadia, Sr. Presidente, talvez alguns questionem o porquê de me preocupar tanto com assuntos de outros países, mas para mim isto não é de outro país, isto nos afecta directamente, e mais dias ou menos dias, poderemos ser vítimas da conspiração, aliás, já somos. Recordam-se dum falso espião que quis abanar o nosso país, listando traficantes sem nenhuma investigação e sem nenhuma fonte?

ALERTA VERMELHO, tomemos cuidado meus compatriotas, mantenhamos a cultura e espírito de resolver os nossos próprios problemas sem interferências.

Há muito que se pode falar deste mundo doente e em perigo Sr. Presidente, mas por agora, e com a sua permissão, termino esta missiva, com votos de bom trabalho a si e a todos os moçambicanos.

Kanimambo,

Alvo Ofumane